Eu não levava o Cinema a sério. Para
mim ele se resumia a blockbusters americanos com tiros, explosões e morte, não
podia sequer ser considerado uma Arte, como a Música, o Teatro, a Poesia. Eu
não sabia o que era o Cinema, mas o desprezava. Eu era um completo ignorante.
Na verdade o Cinema é muito mais que
isso, é uma Arte de verdade, feita por artistas de verdade. Se os artistas diretores
de cinema tivessem nascido na Itália renascentista, teriam sido excelentes
pintores, escultores ou arquitetos. Porém, por terem nascido em sua maioria no
século XX, escolheram essa arte nova, com todas as suas novas possibilidades de
expressão.
O véu da ignorância foi retirado aos poucos,
conforme fui aprendendo com meu mestre e amigo T. B. de Mello que o cinema
possui vários movimentos, como o Expressionismo alemão, a Nouvelle Vague
francesa, o Surrealismo, dentre muitos outros que serão estudados nesse curso.
E hoje em dia, como está o Cinema? Eis que vos digo que o Cinema está em crise,
na UTI enquanto arte. Uma grande contradição caracteriza o Cinema atual: Se em relação
à tecnologia o Cinema avança e nos impressiona com seus efeitos especiais em
3D, em termos artísticos a queda de qualidade é notória. Tal característica beira
o absurdo hoje em dia quando vemos filmes praticamente sem história, com foco
total nos efeitos especiais, como é o caso do filme Gravidade, com George “ator
de um papel só”Clooney e a péssima Sandra Bullock, atriz de filmes “E viveram
felizes para sempre”, mentiras que não te preparam para as porradas da vida. Os
efeitos em 3D do filme Gravidade são realmente fascinantes, precisamos admitir.
Mas e a história, que deveria ser o principal? Não existe. Ou melhor, a
história é essa: Uma missão espacial, dá merda, coisas explodem, eles tem que
se salvar. Qualquer comparação com 2001, uma odisseia no espaço é não ser justo
com o mestre Kubrick.
Vamos entender por que alguém cria
uma história tão ruim como essa: Quando o maldito roteirista cria chorumes como
o anteriormente descrito é evidente que ele não diz: “Pessoal, tive uma idéia
brilhante, faremos um filme muito profundo!”. Nada disso, ele tem completa
noção de que fez uma merda. Na verdade,
ele diz: “Pessoal, olha a minha idéia, vamos vender muito!”. Não se faz arte de
verdade partindo do pensamento “como fazer um filme que venda muito?”. Só
vendidos pensam assim (a imensa maioria). Por isso esse filme, assim como
muitos outros, está condenado ao esquecimento; já as pérolas que trataremos
nesse curso são eternas.
Maldita cultura de massa que reina
nos nossos dias! Tudo é o consumo! A arte está capenga, ela simplesmente não
funciona nesse mundo de massas consumista. Alguns bravos artistas insistem em
escrever, fazer músicas, criar uma arte contemporânea, e conseguem criar uma
arte de valor. Entretanto poucos dão atenção a eles, pois é preciso se demorar
na contemplação de uma obra de arte, e o ser humano tem pressa. Um detalhe
importante que contribui para a crise atual da arte é que muitos movimentos
explodiram no século XX, muitos “ismos”, como Surrealismo, Dadaísmo,
Expressionismo, Modernismo, Futurismo, ou seja, muitas formas de expressão
foram esgotadas. O artista de hoje tem uma grande dificuldade de criar algo
realmente original. Mas a arte não pode acabar. Se tudo já foi criado,
escrevamos sobre o fato de tudo já ter sido criado.
Freud afirma que quando estamos
inseridos numa massa, como um partido político ou exército, entre outras coisas
nossa capacidade intelectual diminui. Quando ele escreveu isso, a sociedade não
era composta dessa massa imensa de “consumidores pop com pressa” como vemos
hoje em dia. Então apliquemos essa ideia da psicologia de forma mais
abrangente: A grande massa existe e está aí engolindo a todos que ela consegue
com seus dentes podres que rebaixam e igualizam. O ser humano que se deixa
engolir por ela só sobrevive, sendo uma ovelha guiada pelos ditames do sistema.
O cinema de blockbuster americano, com seus filmecos feitos para arrecadar
milhões cumpre seu papel massificador com louvor.
Esse curso de História do Cinema tem um
claro objetivo: Fazer com que mais pessoas deixem a massa, e passem a refletir,
questionar, entender o mundo que nos cerca e sempre pensando na práxis:
Transformar o mundo para melhor. Para isso, é necessário deixar a massa e se
tornar um indivíduo, e o Cinema com letra maiúscula contribui e muito para tal,
porquanto dá cultura e estimula a reflexão. Sejamos sinceros: É mais cômodo
permanecer na massa. Fazer o que todos fazem é aceitação garantida. Muitas
vezes você sofrerá por agir contra a ditadura do impessoal. Os que não pensam
levantarão o dedo acusador contra você que pensa. A massa não aceita
desertores, ela vai fazer de tudo para ter você de volta (seja forte, lembre-se
de como Nelson Rodrigues tratava a unanimidade). Enquanto todos não pararem de
pensar, não questionarem, não se vestirem igual e não fizerem as mesmas coisas,
a massa, esse monstro real, continuará com sua maligna missão de, na era da
robótica, te transformar num robô. Por favor, se as palavras desse parágrafo te
tocaram, leia “Country of the blind” do Wells.
Você, leitor, que ainda não conhece o
Cinema artístico, provavelmente vai estranhar os eventos não acontecerem tão
rápido e a ausência de explosões e FBI em alguns filmes. Talvez inclusive esteja
achando essa aula introdutória grande demais. Sabemos que você tem pressa, mas
fique calmo, os filmes artísticos são mais lentos mesmo, e com a prática você
sabe que o ser humano se adapta a tudo. Lembre-se que o objetivo é justamente esse,
frear um pouco, demorar-se, para só assim refletir. Quando o mundo mágico do
cinema mudo e em preto e branco se abrir para você, não julgue ele de cima para
baixo do topo da sua montanha tecnológica: Eles são um convite a uma viagem no
tempo, então entre nesse portal e julgue o filme com a tecnologia existente na
época. Quando assisti o excelente filme mudo e em preto e branco “Siegfried” do
grande Fritz Lang, com orquestra tocando a trilha sonora no Municipal, na parte
em que o dragão aparece eu pensei: “Como ele conseguiu fazer esse dragão
naquela época?”. O resto do público gargalhou, pois certamente comparou o
dragão com os dragões super bem feitos da nossa alta tecnologia 3D. Ignorantes,
riram de uma obra de arte de verdade. Por isso é bom assistirmos filmes com
outras pessoas, pois faz parte do que chamamos Cinema a análise das reações
dos demais expectadores.
Sem dúvida muito aprenderemos juntos nesse
curso. Assim como Hannah Arendt, uso o escrever como modo de compreender. Já
espero comentários como, por exemplo, “Gostei, só ficou faltando falar do filme
X”. Por favor, façam isso, lembrem-se de que também quero aprender, não é falsa
modéstia. Quem me conhece sabe que quando sei falo que sei, quando não sei falo
que não sei. Inclusive acho que isso é uma virtude, que está no meio de dois
extremos, quais sejam, o metido que acha que sabe tudo e o modesto que se
rebaixa a todo instante, mesmo quando tem talento, como Bertolt Brecht que
dizia que era sortudo e não talentoso. Porém, não se esqueçam de que toda “História”
é uma seleção. Todo autor seleciona a metodologia, os problemas a serem
encarados, os movimentos artísticos e autores a serem abordados, bem como qual
será seu foco. Terei como método o uso de uma linguagem direta e acessível e
abordarei um a um os diversos movimentos da História do Cinema. Focarei nos
filmes menos manjados, por motivos óbvios, e tentarei passar minhas impressões
pessoais dos filmes que mais me marcaram, para ficar algo bem apaixonado. Terei
como base o livro “História do cinema mundial”, organizado por Fernando
Mascarello. As aulas serão publicadas no facebook semanalmente ou quinzenalmente
ou catorzenalmente, assim que eu terminar a aula. Quero pesquisar, aprender e
fazer algo de qualidade, portanto, sem pressa e sem pressão!
Quem me conhece sabe que sou muito
eurocêntrico, e pretendo, pelo uso do Cinema, conhecer o Outro, como o “oriental”,
o africano, o chinês e até mesmo o brasileiro, que, fato interessante, muitas
vezes se mostra para mim como sendo o Outro. Para isso, pretendo após o término
da apresentação dos movimentos dedicar aulas inteiras sobre o cinema Africano,
Iraniano, Coreano, entre outros, mas para isso preciso estudar muito mais e ver
muito mais filme. O Outro que me aguarde.
Além da busca pelo aprendizado, escrevo essa História porque quero passar
conhecimento, não penso em publicar, tampouco em ganhar um centavo por ela (por
isso provavelmente vai ficar bom). Nasci com um defeito de fabricação que me
faz ter mais paixão pela vida, pela verdade e pelo saber do que pelo dinheiro. Sinto
uma obrigação moral de passar adiante o conhecimento que adquiri. É algo muito
forte que age em mim, um dever de responsabilidade que se transforma em culpa quando
eu guardo o conhecimento no meu cérebro e não compartilho com os demais. Eu só
conheci esse mundo mágico do Cinema porque um amigo me apresentou. Algumas pessoas
conseguem fazer conquistas intelectuais sozinhas, outras precisam de um
empurrão. Esse curso é o meu empurrão. Espero que gostem das aulas.
Vamos aumentar esse time de Indivíduos,
porquanto somos muito poucos! Assim, nós, solitários em meio à multidão,
seremos solitários em companhia.
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